Autor: Marcelo Bacchi - advogado. Pós graduado em Direito Público (2012) e Ciências Penais (2013)
O
mercado imobiliário brasileiro está aquecido. Inúmeras construtoras estão sendo
criadas, ao passo que outras já consolidadas no mercado estão se expandindo
para regiões outrora carentes e inclusive outros países. Não obstante, o
crédito imobiliário está mais acessível à população ao passo que as várias
opções de financiamento voltadas para os diferentes tipos de imóveis tornam o
sonho da aquisição da casa própria uma realidade latente no país.
Construções
residenciais se espalham por todos os bairros da cidade e as opções de compra
são variadas a depender da classe do comprador, que poderá adquirir seu imóvel
num condomínio de casas térreas ou uma unidade habitacional num prédio de
apartamentos, por exemplo.
Apesar
das facilidades do financiamento imobiliário, há quem prefira o aluguel por várias
razões, seja porque ficará num local por tempo determinado e não definitivo, ou
ainda porque intenta juntar recursos para adquirir seu imóvel próprio sem
financiamento, enfim, somente a pessoa poderá saber qual a melhor opção a ser
tomada.
A
escolha da moradia num condomínio de edificações residenciais é uma decisão que
deve ser conscientemente tomada pelo proprietário ou locatário porque, além da
sua unidade privativa, existem áreas comuns compartilhadas por todos os
condôminos.
Não
se pode negar que há vantagens em morar no condomínio, quer seja pela segurança,
quer seja pela área de lazer, enfim algumas vantagens que talvez não fosse
possível tê-las caso residisse uma casa autônoma. Por outro lado, deve ter
plena consciência que o respeito ao semelhante é uma regra básica dos
condomínios, mormente porque desfrutará de locais comuns a todos os moradores.
Entretanto,
não se pode olvidar que para desfrutar destas comodidades o morador de um
condomínio edilício deve incluir nos seus gastos mensais mais uma despesa, qual
seja, a taxa de condomínio.
Diz
o artigo 1.336 do Código Civil:
São deveres do condômino:
I - contribuir para as despesas do condomínio na
proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção;
(...)
Conforme
previsto na lei civil, é obrigação do condômino pagar a taxa de condomínio, sob
pena de serem tomadas medidas para o recebimento da mesma.
A
primeira medida advém do próprio condomínio ao estipular sanções no caso de
inadimplência, nos termos do § 1º do artigo 1.336 do Código Civil: § 1o – O condômino que não pagar a sua
contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo
previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.
Assim,
caso haja atraso no pagamento da taxa condominial, serão devidos juros
moratórios e multa. Neste caso houve o pagamento, porém tardio, e por
consequência incidiu juros e multa.
Situação
diversa ocorre quando o condomínio necessita ingressar em juízo para receber a
taxa de condomínio.
Se a
demanda for favorável ao condomínio, além dos juros e multa, poderá ocorrer
ainda a condenação do devedor no pagamento dos honorários advocatícios e das
custas processuais. Obviamente ao devedor, réu na ação, durante a tramitação da
demanda judicial lhe é dada a garantia constitucional da ampla defesa e do
contraditório.
Julgada
procedente a ação e o condômino devedor efetuar o pagamento integral da dívida da
qual fora condenado, o processo será extinto e arquivado.
Entretanto,
há inúmeros casos em que o devedor não cumpre com a obrigação que fora
condenado, deixando transcorrer o prazo para o pagamento sem se manifestar a
respeito, cabendo então ao condomínio dar prosseguimento na ação.
Para
garantir seu crédito no cumprimento da sentença, o autor (condomínio) poderá pedir
ao juízo a penhora de bens do devedor.
Nos
termos do artigo 655 do Código de Processo Civil, há uma ordem de preferência
na penhora. Vejamos:
Art. 655. A penhora observará,
preferencialmente, a seguinte ordem:
I - dinheiro, em espécie ou em depósito ou
aplicação em instituição financeira;
II - veículos de via terrestre;
III - bens móveis em geral;
IV - bens imóveis;
V - navios e aeronaves;
VI - ações e quotas de sociedades empresárias;
VII - percentual do faturamento de empresa
devedora;
VIII - pedras e metais preciosos;
IX - títulos da dívida pública da União, Estados e
Distrito Federal com cotação em mercado;
X - títulos e valores mobiliários com cotação em
mercado;
XI - outros direitos.
Assim,
os bens imóveis constam no rol apresentado pelo artigo 655 do CPC e podem ser
penhorados pelo juízo para garantir o pagamento da dívida condominial. Eis aqui
o cerne da questão.
Nas
dívidas de condomínio a própria unidade privativa, ou seja, o apartamento em
si, poderá ser penhorado, ir a hasta pública e arrematado por terceiros, mesmo
que este seja o único imóvel do devedor.
Há
no direito brasileiro o instituto jurídico do “bem de família”. A Lei 8.009/90
que dispõe sobre a impenhorabilidade deste bem assenta no artigo 1º o seguinte:
“O imóvel residencial próprio do casal, ou
da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de
dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída
pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele
residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei”. O artigo 5º conceitua residência: “para
os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta lei, considera-se residência
um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente”.
Ocorre
que o artigo 3º da lei traz um rol de exceções onde a penhora deste único bem
imóvel é permitida.
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo
de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza,
salvo se movido:
I - em razão dos créditos de trabalhadores da própria
residência e das respectivas contribuições previdenciárias;
II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento
destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e
acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;
III -- pelo credor de pensão alimentícia;
IV - para cobrança de impostos, predial ou
territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;
V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como
garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;
VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para
execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento
de bens.
O
Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário 439.003/SP, Relator
Ministro Eros Grau, já se posicionou acerca do tema. Vejamos:
EMENTA: RECURSO
EXTRAORDINÁRIO. BEM DE FAMÍLIA. PENHORA. DECORRÊNCIA DE DESPESAS CONDOMINIAIS.
1. A relação condominial é,
tipicamente, relação de comunhão de escopo. O pagamento da contribuição
condominial [obrigação propter rem] é essencial à conservação da propriedade,
vale dizer, à garantia da subsistência individual e familiar --- a dignidade da
pessoa humana. 2. Não há razão para, no caso, cogitar-se de impenhorabilidade.
3. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
O
artigo 1.715 do Código Civil Brasileiro, no mesmo sentido, dispõe: “o bem de família é isento de
execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de
tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio”.
Veja
que o artigo acima é claro ao excepcionar a regra da isenção do bem de família
acerca das execuções por dívidas, na medida em que claramente estabelece que
nas despesas de condomínio o bem imóvel objeto desta dívida poderá sofrer as
consequências da execução e posterior perda deste bem.
Portanto,
aquela noção de que o único bem imóvel não pode sofrer constrição judicial para
pagamento de dívidas não é uma regra absoluta, comportando, portanto, exceções.
Os
artigos acima demonstram cabalmente que a regra da impenhorabilidade do único bem
imóvel sofre exceções em várias situações distintas, como por exemplo, para
garantir dívidas trabalhistas de empregados da residência; pagamentos de pensão
alimentícia; fiadores em contratos de locação; cobranças de IPTU; taxas devidas
em função do imóvel, no caso as taxas de condomínio, dentre outras.
Portanto,
aos devedores que se escondem atrás de falsas percepções de que seu único
imóvel não servirá de garantia para saldar obrigações descumpridas, a depender
da dívida, cairá nas exceções apontadas pela lei e o seu bem poderá ser
penhorado e arrematado para o pagamento do débito com o condomínio.
Merece
aplauso a lei que excepciona a regra da impenhorabilidade do único bem familiar
e garante a penhora do mesmo para o pagamento da dívida condominial porque, se
assim não fosse, pairar-se-ia a injustiça sobre os demais condôminos que arcam
com suas obrigações mensais. Conforme dito, há vantagens em residir num condomínio
e exceções louváveis advindas da lei que intenta afastar devedores desavisados
no tocante a sua obrigação mensal de pagar a dívida rateada entre os moradores.
Assim, mesmo que o único bem imóvel seja
instituído como bem de família, ao devedor das despesas de condomínio não se
aplicam as regras da impenhorabilidade, podendo ele sofrer as consequências da
execução judicial e posterior perda do imóvel pela dívida não paga.
REFERÊNCIA
BIBLIOGRÁFICA
BRASIL. Lei
n.º 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869.htm>.
Acesso em: 20 set 2013.
BRASIL. Lei
nº 8.009, de 29 de março de 1990. Dispõe sobre a impenhorabilidade do bem
de família. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8009.htm>.
Acesso em: 20 set 2013.
BRASIL. Lei
nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>.
Acesso em: 20 set 2013.
Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <www.stf.jus.br>.
Acesso em: 23 set 2013.